A pandemia de SARS-CoV-2 relembrou a humanidade sobre o poder de um microrganismo. Um vírus tão pequenino, conseguiu mudar o mundo. As técnicas moleculares atuais, no entanto, nos mostram que a diversidade de microrganismos é imensa e que apenas uma minúscula parcela dela é capaz de nos causar doenças. Pelo contrário, eles são responsáveis pelo sustento da vida do planeta.
Nesse contexto, os microrganismos do solo têm grande destaque. Realizam a ciclagem de nutrientes, degradam matéria orgânica recalcitrante e são capazes até mesmo de despoluir o solo. Tudo isso, graças ao imenso potencial metabólico que eles apresentam e as interações que eles proporcionam.
Entenda como as interações microbianas podem revolucionar a agricultura!
Estrutura do solo
A matriz do solo é um complexo constituído por agregados e microagregados. Essas estruturas, formadas pelos componentes do solo, ocorrem devido às forças de atração entre partículas. Diversos microagregados, agrupados por complexos organominerais, matéria orgânica, fungos e raízes de plantas, formam os macroagregados.
Esses arranjos, combinados ao conteúdo de matéria orgânica e aos canais de água (que podem assumir diferentes formas e tamanhos) formados entre eles, formam a unidade básica de estrutura e função na maioria dos solos. A manutenção dessa estrutura do solo é muito importante, por estar diretamente relacionada com suas funções.
Funções dos microrganismos do solo
E que funções são essas? São várias! Vejamos alguns exemplos. Os microrganismos são responsáveis pela decomposição da matéria orgânica de maneira total ou parcial, conferindo a adição de matéria orgânica ao solo.
No processo de decomposição da matéria orgânica são formados os compostos orgânicos voláteis (VOC´s), diretamente relacionados com a promoção do crescimento vegetal.
Os microrganismos do solo também podem consumir e produzir outros gases atmosféricos como hidrogênio, CO₂, oxido nítrico, óxido nitroso, metano. E, dessa forma, também tem um papel na regulação do clima. O metano, produzido pelas arqueias metanogênicas, também tem um importante papel no ciclo do carbono, ao interligar os dois processos envolvidos na ciclagem do carbono.
Outro exemplo da importância dos microrganismos na ciclagem dos nutrientes é a fixação de nitrogênio. Uma etapa do ciclo do nitrogênio muito importante para a disponibilização desse nutriente às plantas, mas realizado por poucas espécies de microrganismos. Além disso, também realizam processos como fotossíntese, respiração e fermentação, responsáveis pela ciclagem do carbono.
Interações microrganismos-plantas
Os microrganismos desenvolvem diversas interações com outros organismos presentes no solo. Interações, essas, que podem ter consequências maléficas para o solo e cultivos. Por que exatamente as plantas interagem como os microrganismos?
Os microrganismos beneficiam-se do abrigo e de compostos liberados pelas plantas que lhes servem como fonte de nutrientes. Já para as plantas, a interação é importante na aquisição de nutrientes e na produção de compostos interessantes como os fito hormônios.
Ademais, as associações provêm importantes serviços ao ecossistema, promovendo o crescimento vegetal, controlando patógenos, diminuindo o impacto por estresse abiótico, etc.
As interações microrganismos-plantas muitas vezes envolvem um sistema de comunicação. Um muito conhecido é o quorum sensing. Baseado em sinalização química, esse sistema está relacionado com diferentes processos microbianos e pode empregar diferentes estratégias para sua realização.
O conceito fundamental, no entanto, necessita de grande densidade populacional para obter êxito, pois em baixas densidades populacionais, a atividade em questão não apresentaria resultado satisfatório.
Aplicações das interações microrganismos-plantas no melhoramento de cultivos
Ao desvendarmos os mecanismos que regem as interações, podemos usá-las no melhoramento de cultivos. Dessa maneira, as próprias interações benéficas apresentam um potencial biotecnológico que pode ser aplicado no aumento da produtividade. São muitas possibilidades. Seguem alguns exemplos:
- os microrganismos presentes no solo podem ser manipulados pelas técnicas de manejo ou pela adição/ativação de moléculas sinalizadoras que atraem microrganismos desejados, assim, estimulando e fortalecendo as relações mutualísticas;
- o solo pode ser inoculado com linhagens microbianas de interesse. Denominados consórcios, esses podem funcionar como biofertilizantes ou biopesticidas e podem ser compostos por vários microrganismos com funções diferentes e complementares que promovem o crescimento vegetal;
- é possível selecionar microrganismos de modo que eles sejam passados a outras gerações. Isso envolve a seleção indireta, pois se baseia na propagação de um fenótipo do hospedeiro afetado significativamente pelo microbioma (microrganismos + ambiente circundante).
Ou seja, a seleção de plantas que, mesmo expostas a estresses, não apresentem sintomas. Assim, as bactérias responsáveis pela resistência podem ser identificadas, isoladas e inoculadas em outros vegetais;
- produção de plantas transgênicas. O genótipo da planta tem um papel essencial na determinação e função do microbioma da rizosfera. Dessa forma, é possível desenvolver plantas com a habilidade de atrair microrganismos benéficos. Ou seja, que liberem hormônios ou exsudatos específicos para atrair e manter a microbiota benéfica desejada.
A exploração molecular detalhada das interações benéficas entre microrganismos e plantas representa uma forma sustentável de diminuir a dependência pelos agroquímicos e fertilizantes.
Afinal, esses dados nos permite compreender como as práticas agrícolas influenciam o microbioma, a desenvolver estratégias que modulam o microbioma em uma direção desejada, a produzir biotecnologias que permitem o desenvolvimento vegetal, etc. Somados, esses esforços garantem a segurança alimentar e diminuição dos impactos ambientais.
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